Endometriose: professor de Medicina esclarece dúvidas sobre doença que afeta milhões de mulheres no mundo - Unijuí

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Endometriose: professor de Medicina esclarece dúvidas sobre doença que afeta milhões de mulheres no mundo

No início do mês de julho, a cantora Anitta revelou, em suas redes sociais, ter sido diagnosticada com endometriose, doença que afeta 180 milhões de mulheres no mundo. Os dados, da Organização Mundial da Saúde (OMS), mostram ainda que, somente no Brasil, 7 milhões de mulheres sofrem com essa situação.

Ao compartilhar as informações em seu Twitter, a artista carioca contou que sofre de dores crônicas há, pelo menos, nove anos, e que sempre recebeu o mesmo diagnóstico: infecção urinária recorrente. Porém, mesmo tentando todos os tratamentos possíveis, as dores persistiam. 

O quadro de dor crônica é justamente o principal sintoma dessa doença tão comum entre as mulheres, mas ainda pouco falada. Devido às dores intensas, a endometriose prejudica a qualidade de vida daquelas que são afetadas por essa condição. É o que relata o médico ginecologista e obstetra, coordenador das Unidades de Ensino e Aprendizagem de Saúde da Mulher do curso de Medicina da Unijuí, Dario Gervasio Ronchi. 

O professor, que concedeu entrevista à Rádio Unijuí FM, explicou mais sobre o que é endometriose, suas causas, sintomas e tratamentos disponíveis. Ele também falou sobre como o diagnóstico é feito pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e ressaltou que, entre os objetivos do curso de Medicina, está fazer com que os acadêmicos atuem junto à comunidade e conheçam sua realidade o mais cedo possível.

Confira a entrevista completa:

O que é endometriose?

A endometriose é uma doença provocada pela presença de células endometriais - isto é, células da camada interna do útero (o endométrio) - em algum lugar fora do útero, como ao redor dos ovários, do intestino ou na parede do abdômen.

Quais são as causas da doença? 

Apesar da endometriose ser estudada há muito tempo, não se sabe exatamente qual é a sua causa. Existem várias teorias e possibilidades. Uma delas, que é aceita, é de que a endometriose se origina de uma menstruação retrógrada. O que é isso? Um pouco do sangue menstrual pode refluir pelas trompas, pelas tubas uterinas e se acumular ao redor do ovário, ao redor do útero, pelo lado de fora. Outra teoria seria de uma transformação por estímulo hormonal. As células que revestem o ovário e a parede do intestino têm a mesma origem da célula do útero. Por algum estímulo hormonal elas poderiam se diferenciar e se transformar em célula endometrial. Então são teorias. 

Existem tipos de endometriose? 

A endometriose pode ser classificada dependendo do lugar onde aparece esse foco de células que estão fora do lugar. Se aparecer o foco no ovário, chamamos de endometriose ovariana. Se aparecer no intestino, endometriose intestinal. Quando essas células aparecem e se infiltram na parede vaginal, entre a vagina e o intestino, chamamos de endometriose profunda, e isso é causa de muita dor e desconforto. 

Quais são os sintomas?

Uma coisa que não falei ainda, que é o que faz com que esse tema seja bem importante, é que a endometriose acomete 10% das mulheres em idade fértil. É uma incidência muito grande. E o problema da endometriose é que, na maioria das vezes, apesar da paciente ter sintomas há bastante tempo, o diagnóstico acaba sendo demorado, tardio. Muitas vezes vamos diagnosticar essa doença quando ela já está em um estado mais avançado. 

Sobre os sintomas, o quadro é basicamente de dor. Uma dor crônica, antiga. A paciente tem dor durante o período menstrual, durante a relação sexual, durante todo o mês tem aquela dor, então isso acaba atrapalhando e deixando a qualidade de vida dessa mulher muito ruim, afeta bastante. 

Como é realizado o diagnóstico? 

Em caso de dor crônica, a mulher vai suspeitar. Por exemplo, uma adolescente que sempre teve dor no período menstrual e nunca melhorou com nenhum remédio, uma mulher que está tentando engravidar e não consegue, uma mulher com vida sexual ativa e que tem dor em todas as relações sexuais, ela vai suspeitar e vai procurar o auxílio médico. O médico ginecologista vai examinar, avaliar e solicitar exames. Infelizmente, a maioria dos exames de laboratório e de imagem não mostram e não dão diagnóstico de endometriose. Geralmente, a ressonância magnética é um exame que ajuda, mas o diagnóstico definitivo da endometriose é feito por um exame realizado a nível hospitalar, que é a videolaparoscopia. Com esse exame, conseguimos visualizar onde tem lesão dentro da cavidade pélvica da mulher, fazer a biópsia para confirmar se realmente é endometriose e já dá para fazer o tratamento na hora. Já dá para cauterizar e retirar o que tem de errado. 

A videolaparoscopia é conhecida como padrão ouro de diagnóstico para endometriose. Os outros exames, mesmo a ressonância, são todos uma suspeição que vamos ter. Mas como a videolaparoscopia é um exame relativamente caro e difícil, muitas vezes pelo histórico da paciente, pelo exame físico e também pela experiência do ginecologista já dá para ter uma suspeição e fazer o tratamento.

Quais tipos de tratamentos são realizados?

O tratamento da endometriose visa aliviar a dor. Como a paciente sente dor quando está menstruando, o tratamento basicamente será suprimir a menstruação, fazer com que essa paciente não menstrue. Isso já vai fazer com que diminua o foco de endometriose. 

Existem alguns estudos que associam a endometriose com infertilidade. Não se tem certeza de que a endometriose cause infertilidade. O que sabemos, de certeza, é que 50% das mulheres inférteis têm endometriose. Se eu estou diante de uma paciente que tem um quadro de infertilidade e eu descubro que ela tem endometriose, o tratamento dessa paciente vai ser para tentar restaurar a fertilidade dela. Então os pilares do tratamento da endometriose são: acabar com a dor e, se a paciente é infértil, tentar restabelecer essa fertilidade, se possível. Isso é através da própria videolaparoscopia que já vai ajudar e tratamentos hormonais para inibir a menstruação. 

E há uma cura definitiva? 

Uma cura definitiva não existe. Como ela tem um fundo hormonal, nós não temos como fazer o tratamento e a paciente nunca mais ter endometriose. O que a gente consegue é fazer com que ela fique por muito tempo em remissão, ou seja, sem apresentar sintomas. Por exemplo, aquela paciente que está tentando engravidar, descobre a infertilidade, trata, consegue engravidar, os sintomas melhoram, passa uma temporada, cinco, seis anos sem ter nada, mas dali a pouco os sintomas começam devagarinho a voltar, porque os focos começam a voltar.

Quais os prejuízos para as pacientes que não tratam a doença? 

A consequência do não tratamento da endometriose será justamente a piora na qualidade de vida da mulher. Além disso, existem alguns estudos, bem recentes, que associam a endometriose com o câncer de ovário. Esses estudos indicam que a mulher que tem endometriose teria uma chance em torno de 1,8 vezes maior de ter câncer de ovário do que a população normal. Isso é um risco bem moderado. Então a paciente que sabe ou suspeita que tem endometriose, deve investigar e tratar, porque, daqui a pouco, isso pode ter consequências para o seu bem-estar e para a sua vida e saúde.

Como fica a questão das mulheres que procuram o Sistema Único de Saúde? Como esse acolhimento é feito nos postos de saúde?

Aqui no nosso município funciona mais ou menos dessa forma: a paciente vai passar na sua Unidade de Saúde, que é próxima da sua casa, terá um atendimento com a enfermeira ou com o médico da unidade e então será determinado que há necessidade de uma consulta especializada. Ela será encaminhada para o Centro de Saúde da Mulher, que aqui em Ijuí é na Secretaria Municipal de Saúde, popularmente chamada de ‘Susão’, onde atendem os ginecologistas do município. A paciente terá uma consulta com o ginecologista, serão feitos exames e encaminhados. Se ficar decidido que precisa fazer uma videolaparoscopia, será encaminhada para autorização via regulação do Estado e então é feita pelo Sistema único de Saúde (SUS). Tudo o SUS cobre. Claro que é um passo a passo e não é do dia para noite que isso acontecerá. Mas existe essa possibilidade, existe esse trajeto e, por isso, quanto mais precocemente a paciente for atrás, mais rápido conseguirá o seu acompanhamento e tratamento. 

Às vezes, só procuramos atendimento diante da dor, que não é o normal. Sobre a questão da medicina preventiva, como podemos criar uma cultura de cuidado e de não procurar auxílio só no caso de dor?

Sabe-se que a prevenção é sempre o melhor remédio. No momento em que você faz exames periódicos, exames de rastreamento para qualquer patologia, seja para câncer do colo do útero, para câncer de próstata, você consegue pegar qualquer alteração no início e, na maioria das vezes, o tratamento no início é muito menor e mais simples. Então, é preciso ficar atento aos sintomas, conhecer o seu corpo, saber como funciona e saber se impor: ‘não estou me sentindo bem, isso aqui não está certo’. Já ir procurar auxílio é muito mais importante do que deixar e, de repente, ter que fazer uma cirurgia para curar um câncer.

O curso de Medicina da Unijuí estuda muito essa questão da medicina junto à comunidade. Como é essa atuação junto à comunidade?

O curso de Medicina da Unijuí está intimamente ligado com o Sistema de Saúde do município, tanto a nível de Prefeitura como a nível hospitalar. Existe uma procura de fazer com que o acadêmico entre em contato o mais precocemente possível com esse ambiente de trabalho e conheça a realidade em relação a saúde dos habitantes do município. Existem atividades práticas que são feitas a cada semestre na saúde coletiva, nos ambulatórios de especialidades, no ambulatório de ginecologia, ambulatório de obstetrícia, de pediatria e o acadêmico vai se inserindo e vai vendo a realidade da população. A cada semestre existe uma disciplina que chamamos de unidade integradora. Nessa unidade integradora é proposto que os alunos escolham um tema, um assunto para ser desenvolvido. Geralmente, esse assunto é um problema que eles percebem nas Unidades de Saúde, uma dificuldade que a população passa, por exemplo, uma dificuldade de atendimento ou para receber determinada medicação. Então os estudantes fazem um trabalho para tentar resolver esse problema. E é muito interessante porque é o retorno que o acadêmico e a Universidade dá para população, para comunidade. Eu acho que o curso de Medicina está evoluindo nesse sentido e está indo muito bem. 


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